Boca Carnuda
Entrando num açougue recém inaugurado e próximo da minha casa, deparei-me com uma cena rodriguiana, mas ao vivo e a cores.
O sujeito que personificava o atendente era um moreno tipo amante latino, cabelo preto liso. Ele é imenso, forte e bonito e com uma maneira de atender aos clientes sui generis e muito carismática. Homens e mulheres ouvem o que todo cliente gosta: “estou a seu dispor, escolha o que quiser, estou às suas ordens”.
Mas nem todo cliente tem as ancas daquela morena de aparelho nos dentes que logo depois de mim entrou no açougue. Em meio a carnes, sangue e opulência, ela é recepcionada pelo latino extrovertido e galante com um sincero "estou a seu dispor, morena. Escolha o que for de seu agrado". Ela assim o fez, como se pudesse desobedecer a uma ordem tão direta e macia. A morena opulenta e faceira, sentindo-se a própria, se achando, fez suas escolhas, embora a ordem de chegada ainda não a beneficiasse, mas todos os clientes não ousavam retrucar diante de tal imagem, como se de alguma maneira todos pudessem adivinhar a cena que estava por vir.
Ela escolheu seu músculo e prontamente foi atendida, escolheu seu filé, no que se seguiu outro pedido e outro e outro... O moço galante fazia-lhe todos os desejos e por fim ela se saciou, pagou e se dirigiu à porta de saída.
Todos os clientes, ainda em alerta, emudeceram e aguardavam. O cheiro de carne é forte e suas cores mais ainda e prontas a serem degustadas, elas, languidamente, estendiam-se em fileiras à espera.
O atendente, com um olhar que dizia mais que toda sua verborréia sedutora, perguntou mais uma vez à morena que ameaçava ir pra nunca mais: "tem certeza que não quer mais nada? Posso imaginar que você quer algo mais? E eu posso te dar. É só pedir". E, num movimento que parecia impossível, ela, mais próxima de atravessar a rua que a faca da carne, volveu toda a sua pessoa e todo o volume dos seus quadris para dirigir-se de volta ao balcão, onde debruçou-se e respondeu:
- Quero sua boca!!
Como num pregão, diante do ultimato e da força do martelo, ele sentencia, após esmurrar o balcão:
- Pois bem, esteja me esperando. Fecho às 8 e meia.
Não pense que em minha cabeça gritos de ovação não explodiram. Sim os gritos estavam, lá. Mas ninguém pareceu ouvi-los e a fila pôde continuar.
Paula Cunha
Entrando num açougue recém inaugurado e próximo da minha casa, deparei-me com uma cena rodriguiana, mas ao vivo e a cores.
O sujeito que personificava o atendente era um moreno tipo amante latino, cabelo preto liso. Ele é imenso, forte e bonito e com uma maneira de atender aos clientes sui generis e muito carismática. Homens e mulheres ouvem o que todo cliente gosta: “estou a seu dispor, escolha o que quiser, estou às suas ordens”.
Mas nem todo cliente tem as ancas daquela morena de aparelho nos dentes que logo depois de mim entrou no açougue. Em meio a carnes, sangue e opulência, ela é recepcionada pelo latino extrovertido e galante com um sincero "estou a seu dispor, morena. Escolha o que for de seu agrado". Ela assim o fez, como se pudesse desobedecer a uma ordem tão direta e macia. A morena opulenta e faceira, sentindo-se a própria, se achando, fez suas escolhas, embora a ordem de chegada ainda não a beneficiasse, mas todos os clientes não ousavam retrucar diante de tal imagem, como se de alguma maneira todos pudessem adivinhar a cena que estava por vir.
Ela escolheu seu músculo e prontamente foi atendida, escolheu seu filé, no que se seguiu outro pedido e outro e outro... O moço galante fazia-lhe todos os desejos e por fim ela se saciou, pagou e se dirigiu à porta de saída.
Todos os clientes, ainda em alerta, emudeceram e aguardavam. O cheiro de carne é forte e suas cores mais ainda e prontas a serem degustadas, elas, languidamente, estendiam-se em fileiras à espera.
O atendente, com um olhar que dizia mais que toda sua verborréia sedutora, perguntou mais uma vez à morena que ameaçava ir pra nunca mais: "tem certeza que não quer mais nada? Posso imaginar que você quer algo mais? E eu posso te dar. É só pedir". E, num movimento que parecia impossível, ela, mais próxima de atravessar a rua que a faca da carne, volveu toda a sua pessoa e todo o volume dos seus quadris para dirigir-se de volta ao balcão, onde debruçou-se e respondeu:
- Quero sua boca!!
Como num pregão, diante do ultimato e da força do martelo, ele sentencia, após esmurrar o balcão:
- Pois bem, esteja me esperando. Fecho às 8 e meia.
Não pense que em minha cabeça gritos de ovação não explodiram. Sim os gritos estavam, lá. Mas ninguém pareceu ouvi-los e a fila pôde continuar.
Paula Cunha
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